sexta-feira, 18 de maio de 2012

No Love Lost


Todos já passamos pela experiência de, ao achar uma foto antiga de si mesmo, ser transportado imediatamente para o momento em que a foto foi tirada: a roupa que vestíamos, com quem estávamos e em que momento nossas vidas estavam naquele momento.  
É bem possível que, hoje, olhando-nos congelados naquele instante, aquelas roupas não nos sirvam mais, as pessoas com quem estávamos eventualmente não estejam mais em nossas vidas e que estejamos em um lugar que não teríamos a menor possibilidade de imaginar que estaríamos no momento em que a foto foi batida.
Entretanto, nos identificamos e nos emocionamos ao nos vermos naquele momento.  Afinal, ainda somos nós ali, sorrindo para a câmera, com outras roupas, outras pessoas e outros sentimentos que, de maneira ou de outra, já não se justificam mais.  Mas, paradoxalmente, ainda existem vivos em algum lugar dentro de nós.

Pensei nisso ao saber que hoje é o aniversário de morte de Ian Curtis, que faleceu 32 anos atrás.

Não escuto Joy Division da maneira como costumava escutar nos anos finais de minha adolescência, porém o impacto que sua música teve em mim é algo que ficou desde então.  Foi provavelmente uma das maiores identificações que já tinha experimentado com uma expressão artística, talvez até hoje.
Tudo relacionado à banda, desde a escolha do nome à estrutura das canções, a postura dos músicos em suas apresentações e, infelizmente, a maneira como Ian Curtis escolheu terminar seus dias, até hoje é de uma coerência e verdade vistos poucas vezes no universo da música pop.

As canções refletiam com precisão a minha maneira de enxergar o mundo na época - e provavelmente muitas das impressões que carrego até hoje.  
Naquele momento de transição para uma vida adulta, subitamente ciente de que não havia nenhum pote de ouro no fim do arco-íris, mas ainda sem a bagagem emocional adequada para dar vazão àquele sentimento de perda casaram como mão e luva com as letras fortes, niilistas e profundamente pessoais de Curtis.  Sua voz transmitia uma tristeza agressiva e não-conformista.  Era punk, mas sem a pretensão de criticar o establishment ou introduzir novos valores baseados em raiva e anarquia: era a constatação viva e consciente de que o problema era outro e que não havia soluções simples.  A complexidade e a falibidade humana sempre seriam obstáculos para a obtenção de um lugar melhor para se viver.  Sem novidade, a canção mais conhecida do Joy Division possui o pungente título de Love Will Tear Us Apart.

O legado de Ian Curtis e do Joy Division foi fundamental para tudo o que seria da música pop nos próximos trinta anos (sem contar ainda a trajetória do New Order, fundada pelos remanescentes da banda após o suicídio de Curtis em 1980).  
Para mim, ficou uma voz que me vez enxergar o meu mundo com olhos abertos.