domingo, 17 de abril de 2011

Em busca da canção perfeita




Eu entendo você.
Eu sei que você também checa 200 blogs de música por dia, seu Twitter é só sobre isso e que você já gastou uma grana obscena com discos, DVDs, pôsteres e bonequinhos. Que a sua casa é entulhada de discos, biografias, ingressos de shows e revistas de música.

Eu sei que você não consegue passar por uma banca de jornal - se for daquelas grandonas, melhor ainda - sem bater o olho na seção das revistas importadas para ver quem está na capa da Word ou da Uncut (grande chance de ser a milésima capa do Paul McCartney ou do Bob Dylan) ou, vai, da Spin ou da Rolling Stone, que mesmo sendo uma merda, a vontade de folhear é maior do que as suas forças. O mundo pegando fogo, invasões alienígenas à sua volta, mulheres nuas correndo em chamas ao seu redor e você plantado de pé ali inconformado como que a Q deu três estrelas pro disco novo do, sei lá, do Eminem - tanto faz se você acha que deveria ser mais ou menos. E não que você seja fã dele ou algo do tipo. Você naturalmente conhece o trabalho do cara, todos os discos, os nomes dos produtores, uma meia dúzia de letras, o normal. O que todo mundo sabe, ué...

Eu sei que você já tem o seu método de anotar em algum lugar todos os discos que disseram ser maravilhosos que saíram na última semana que você precisa escutar - eu pessoalmente uso um programinha no celular. E depois vai passar horas e horas no seu programa de torrent favorito - que a essa altura você já considera como um membro da família.

Você não entende porque o Facebook é tão popular se o Last.fm existe. Qual é o problema das pessoas?

Eu também sei que você sabe a discografia inteira de umas 15000 bandas ou artistas, os nomes e datas dos lançamentos dos discos, os músicos, produtores, nomes de estúdios, o papel de cada um no grande universo da música pop.
A utilidade desse amontoado de informação, você mesmo concorda, é duvidoso mas esse não é bem o ponto.

Não tente me enganar: você pensa sobre isso o tempo todo. Você é capaz de esquecer de vestir as calças quando sai de casa mas nunca esquece o iPod, certo?
Você se sente pessoalmente ofendido quando aquela cantora cujo primeiro disco você gostou tanto de repente vira uma vaca que só aparece em revistas de fofocas, falando merda no Twitter e badalando com celebridades. A coisa era a respeito de música, não era? O que aconteceu?

Eu entendo a raiva que você fica quando alguém comenta sobre uma banda que você já ouviu falar mas, ou pelo celular estar sem bateria para anotar o nome na hora ou por você estar ocupado fazendo outra coisa, tipo trabalhando, você ainda não escutou. Ou a porra da música toca na balada, todo mundo canta e você só pensa onde achar uma conexão de internet bêbado às 3 da manhã.

Eu também, como você, acho que esse negócio de estilos musicais é uma falácia, sabe? Que diferença faz se o negócio é reggae, rap, hardcore, country, metal, eletrônico ou folk? Que saco essa coisa de você ter que se identificar com um estilo, uma tribo e um padrão de comportamento.
Até onde você sabe, música tem que ter pai e mãe. Música tem que emocionar. Ou fazer dançar. Ou fazer cantar junto. Ou te servir como trilha sonora enquanto você está ocupado com o resto da sua vida. Só isso. O resto é perfumaria.

Não fique assim. Eu te entendo.

Eu sei que, na verdade, essa sede de informação não tem a ver com uma necessidade de estar atualizado 24/7. Nem da vaidade de simplesmente ser o portador de tanta cultura e informação
(você já aprendeu do pior jeito que, em algumas situações, ocorre justamente o contrário e pega muito mal quando você resolve, por exemplo, discorrer sobre as diferentes vertentes da música jamaicana enquanto as pessoas que estão ao seu redor só querem que você cale a boca e escute o disco do Bob Marley que tá rolando).

Você, na verdade, está sempre em busca daquela canção, daqueles três ou quatro minutos de perfeição, onde os sons encaixam como por milagre, a letra - se for o caso - te fala de alguma coisa que já estava na sua cabeça e você nem sabia. Onde, por três ou quatro minutos, você não está mais no seu dia a dia, com suas responsabilidades e contradições. É você e aquela canção e só. Você foi abduzido. E a sensação é maravilhosa.

Naquela sua lista infinita do iTunes, você tem a consciência de que a grande maioria das canções ali não necessariamente vão te dizer ou acrescentar algo. A maioria é apenas um passatempo, um barulhinho de fundo. Essas, fatalmente, vão sumir nas areias do tempo e da sua memória, não tem jeito. Outras canções, em compensação, podem até sumir nas areias do tempo mas vão viver para sempre na sua memória e no seu coração.
Aquela canção compartilhada com alguém em silêncio - você sabe qual - aquela que tocou no carro quando aquela boa notícia chegou, os discos que tocaram sem parar durante aquela viagem maravilhosa.
Ou aquelas que te fizeram companhia em momentos mais introspectivos ou menos felizes. Aquelas que, quando todo o resto parecia irremediavelmente perdido, você sabia que ainda podia contar com elas, não importasse a situação.

E quando, num shuffle desavisado, numa terça-feira boba, muitos anos depois, ela te pegar distraído, aquela canção vai te levar de volta a um outro lugar, uma outra época. E você vai viver, durante aqueles três ou quatro minutos, as mesmas sensações que viveu então. Você vai estar em dois lugares no espaço e no tempo simultaneamente.

Não conheço muitas coisas na vida que provoquem esse tipo de sensação...

Relaxa, eu sei como é.

2 comentários:

Mirafuegos disse...

pois é..

Matheus disse...

Valeu esse post aí. Valeu mesmo. :P