terça-feira, 14 de junho de 2011

Everyone Loves You When You're Dead



Neil Strauss é um cara que sabe das coisas.

Jornalista cultural de diversas publicações como o New York Times, Rolling Stone, Spin, entre várias outras, ele dominou o formato de entrevistas oferecendo ao leitor um material muito mais profundo e original do que um informe publicitário sobre o último produto que determinado artista está divulgando como é o lugar-comum no jornalismo musical atual. Em suas conversas francas e diretas, o que importa é justamente o que não está evidente nos releases ou falsas imagens construídas pelos marketeiros de plantão.
Ele também é co-autor da deliciosa biografia do Mötley Crue (The Dirt) e da antiga rainha do cinema pornô Jenna Jameson (How to Make Love Like a Pornstar).

A principal característica de seu trabalho é a compaixão e a empatia que ele demonstra com seus entrevistados. O aparente entendimento de que as pessoas são como são e que não há nada a fazer a não ser tentar entendê-las dá aos entrevistados uma tranquilidade de abrir-se sobre diversos temas que normalmente não lhes são perguntados.
Strauss nunca tenta parecer fazer parte da turma ou mais inteligente ou descolado que as pessoas que lhe dão seus depoimentos. Com isso, ele consegue verdadeiras pérolas!

Seu último livro, Everyone Loves You When Your’re Dead, é fantástico.

A lista dos personagens que dão seu depoimento no livro é quase ridícula: Bruce Springsteen, PJ Harvey, Leonard Cohen, Johnny Cash, Eric Clapton, Marilyn Manson, Grateful Dead, Pink Floyd, Courtney Love, Brian Wilson, Dolly Parton, Snoop Dogg, Oasis, Madonna, Trent Reznor, Lady Gaga, Korn, Britney Spears, Led Zeppelin, the Who e mais uma infinidade de artistas, maiores e menores, alternativos ou comerciais, famosos e anônimos.
Strauss foi consultar diretamente as suas gravações originais das entrevistas e, sem a tesoura editorial que existe nos grandes veículos, pôde tecer uma linha de raciocínio e uma narrativa lógica baseada em diversos trechos de entrevistas, que vão e voltam numa edição ágil e quase cinematográfica, e que expõe diversas opiniões e impressões sobre um mesmo tema, às vezes constrastantes, outras complementares.
O autor nos coloca na cena, nos conta o que está acontecendo enquanto aquela conversa de desenvolve. Sentimos a mesma antipatia do entrevistador enquanto tenta manter uma conversa minimamente coerente com um Julian Casablancas completamente bêbado, chato e alheio ao papo, por exemplo.

Neil Strauss parte da opinião que qualquer entertainer, qualquer ser humano que resolva assumir um papel de protagonista nesse jogo do showbusiness, o arquétipo do “ídolo”, a vida na estrada, a dinheiro, os bajuladores, as diferentes variações do trinômio “sexo, drogas e rock n’roll”, possui alguma forma mais ou menos séria de disfunção - ninguém pode olhar para gente como Marilyn Manson ou Lady Gaga e achar que eles operam na mesma frequência das pessoas como nós que fazem fila no banco ou no cinema.
E tantos deles são tão infelizes, fizeram tanta mas tanta merda na vida, que quase lamentamos as escolhas que eles fizeram e, de certa forma, nos fazem repensar as nossas próprias, de uma forma ou de outra.

Num dos meus capítulos favoritos, o tema que norteava todas as conversas era justamente sobre essa inadequação e essas formas de “loucura” que conduzem um processo criativo. É quase patético ler a entrevista do multi-milionário-agora-ganhador-do-Oscar Trent Reznor, do Nine Inch Nails, discorrendo sobre os malefícios da fama, do quanto ele sentia-se deslocado no mundo, com todo o dinheiro que ele ganhava e que, segundo o próprio, o fazia agir como um asshole com os outros, enquanto vemos entrevistas com outros músicos, igualmente problemáticos mas que verdadeiramente tiveram esgotamentos nervosos, ficaram anos internados em instituições e que nunca realmente conseguiram se encaixar no mundo.
E sem um publicist ou gravadora ganhando em cima.

Para quem gosta desse universo, Everyone Loves You When Your’re Dead é uma aula de jornalismo musical e de cultura pop. É o que acontece nos bastidores, são as pessoas reais (ou uma versão próxima disso) que existem por baixo das imagens que estamos acostumados a consumir.

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