Não sei
dizer em que momento exatamente o sonho morreu.
O fato é que em algum momento aquela cartilha do punk - ou do rock em
geral - do faça você mesmo, das canções
vigorosas, sinceras e diretas, da juventude urbana insatisfeita, virou
referência para jingles de refrigerante e trilhas sonoras de eventos
corporativos sobre skate, tatuagem ou marcas de roupas.
Da mesma
maneira que o rap - e praticamente toda expressão cultural jovem das últimas
décadas - o rock seguiu seu caminho, evoluiu, criou seu mercado, sua
iconografia, seus nichos, vertentes e subvertentes e foi decepcionando os que
ainda acreditavam numa forma de expressão genuína baseado em sinceridade e
urgência de fazer acontecer.
Essa
decepção está ligada também ao nosso próprio amadurecimento e à complexidade
crescente que começamos a vivenciar em nossos pontos de vista conforme
envelhecemos. Quando somos jovens,
achamos que podemos mudar o mundo com três acordes de guitarra, nossos inimigos
são claros e nossa causa é justa. Com o
tempo, percebemos que existem muito mais tons de cinza entre nosso preto e
branco do que gostaríamos de admitir. Percebemos
que não existe uma coisa estática e ameaçadora chamada “sistema” onde podemos
descontar nossas frustrações e culpar por nossa inabilidade de explicar um
mundo com nuances, interesses e camadas demais.
O rock continua sendo vendido - nesse caso, como um sabão em pó ou um
cereal matinal - como “música para jovens” e esse rótulo simplesmente serve de
desculpa para jogar nesse saco uma legião de músicos e bandas medíocres -
alguns mais bem intencionados que outros - que confundem simplicidade com
tosquice, ser direto com ser tolo, com claros interesses comerciais.
Sinto-me
frequentemente dividido nesse duplipensar.
Cresci sob a mitologia do rock n’roll.
Meus heróis empunhavam violões e guitarras, se expunham, chocavam e
levavam sua expressão ao limite, desafiando seus ouvintes e seu tempo. Ao mesmo tempo que quero acreditar que somos
capazes de fazer a diferença, de que qualquer um com vontade de mudanças pode
efetivamente sê-la, sou frequentemente confrontado com meu próprio ceticismo e
desconfiança de qualquer um que realmente esteja tentando.
E, vamos
admitir, meus interesses, receios e anseios também mudaram com o tempo. Hoje eu me preocupo com meu lugar no mundo,
com meus amigos, com amor, com ganhar dinheiro para viver minha vida com algo
que me satisfaça e que não exija minha alma em retorno, todos esses dilemas
morais com que vamos topando conforme vamos vivendo. Minha raiva adolescente foi gradualmente
substituída por uma perplexidade com a vida e uma crescente aceitação da pessoa
que me tornei.
Tudo isso,
ao final, para falar de um disco que me fez parar para pensar em tudo
isso. O nome do disco é Love Ire &
Song e o responsável por essa pérola é um inglês chamado Frank Turner.
Turner foi
o frontman de uma banda de hardcore chamada Million Dead e rapidamente seguiu
por uma interessante carreira solo. Love
Ire & Song é seu segundo disco, de 2008, e despertou paixões na crítica
especializada.
Frank
Turner fez um disco clássico, baseado na cultura punk rock, mas com um
resultado que extrapola essas definições de gênero. Nota-se que seu repertório e suas referências
são bem mais aprofundadas nos cânones e na iconografia do rock como músicas
libertárias e enérgicas do que como mais uma gavetinha dessa cultura. Dá pra ouvir ecos de trovadores folk, de
indie rock, de hardcore e do grime, mas despido de ornamentações e reduzido ao
essencial. O esqueleto das canções
baseiam-se em violão, letras diretas e um senso de construção pop
invejável. Algumas canções já contam com
a banda completa.
Love Ire
& Song é um disco sobre amadurecimento, sobre crescer sendo quem você é,
sobre prioridades e sobre olhar para o futuro.
Suas letras são ao mesmo tempo extremamente confessionais e bastante
abrangentes. Nada é cabeçudo,
panfletário ou doutrinador. Ele
compartilha com o ouvinte suas próprias experiências, deixando a interpretação
livre.
Na faixa que dá nome ao disco, ele se questiona sobre o que
fazer quando suas certezas de outrora viraram fumaça (“And Punk Rock didn't live up to what I hoped that it could be, and all
the things that I believed with all my heart when I was young are just coasters
for beers and clean surfaces for drugs”), e segue pel