sexta-feira, 19 de junho de 2009

Um sopro de verdade



O que sempre me atraiu em música – e na vida em geral – é uma busca por algum tipo de verdade. Como o Elvis Costello já disse antes: “a verdade não pode te machucar, ela é como a escuridão. Te assusta no começo mas depois você enxerga as coisas com clareza e objetividade”. Sem desmerecer ninguém, nunca me interessei por intérpretes, por exemplo. Sempre achei esquisito usar as palavras e os arranjos de outra pessoa para expressar sua própria visão de mundo. É um pouco o que eu faço com freqüência por aqui, mas nunca tive nenhuma pretensão artística com esse meu cantinho solitário de idéias.

Talvez por isso meus heróis sempre foram aqueles que conseguiram criar o seu próprio universo de canções, usando seus próprios sentimentos e histórias para construir um mundo que faz sentido para quem os escuta, um espelho que nos faz enxergar quem somos, quietos com nossos headphones.

Comprei um CD esses dias chamado Sweet Jardim, de uma moça chamada Tiê, daqui de São Paulo. Vi uma resenhinha sobre o disco num site qualquer, com uma foto dela ao lado do texto. Admito que mulher bonita sempre tem automaticamente minha atenção – e a moça é linda! O texto trazia um breve currículo dela, a “nova sensação da MPB dessa semana” e algumas linhas sobre o disco. Fiz uma anotação mental e deixei para lá. Provavelmente ela já é bem conhecida no mundinho alternativo-cultural paulistano, mas como não moro nessa cidade tem algum tempo, perdi todo o hype-Ilustrada em torno da moça. Graças a Deus.

Tem muito tempo que não aparece nada que me interessasse em música brasileira. Justamente por estar sempre em busca de algo que me dissesse algo, alguém que se mostrasse real, sem frescuras e sem recalques, fazia muito tempo que não ouvia nada que me chamasse atenção. Que me perdoem os puristas verde-amarelos, mas a coisa está feia na terra dos sabiás: bandinhas emo de uns moleques remelentos de franjinha que não sabem sequer fazer um refrão decente, que o máximo de erudição musical começa com Red Hot e termina com Linkin Park; bandinhas pseudo-intelectualóides-tropicalistas-antropofágicas-barbudas-de-merda, requentando um som e uma estética que foi transgressor 40 anos atrás e acham que tudo é muito novidade; e o pior, as divas! Essa praga de intérpretes femininas, sempre com os mesmos arranjos cafonas, trejeitos viciados de décadas atrás, cantando sempre as mesmas malditas canções dos sempre mesmos Renatos Russos, Cazuzas, Chicos e Caetanos.

E no meio desse bode todo com a ceninha local, me cai nas mãos essa pequena jóia.
Tiê não quer reinventar a roda, não faz som para ser cult. Não quer ser a nova Elis Regina. Não regravou Zeca Baleiro ou qualquer outra desgraça dessas. Seu disco é composto por 10 pérolas de sua própria autoria, arranjos simples e lindíssimos ao violão, com um piano e um violino aparecendo aqui e ali. As letras são diretas - confessionais, dizem - sem joguinhos de palavras concretas-toscas ou qualquer outro artifício para parecer inteligente. E, lembrando, com a exceção de uma música em inglês e outra em português e francês, todas as músicas são em português. Fica mais difícil de disfarçar qualquer bobagem na nossa língua pátria, não?

Eu não me interesso por artistas, eu me interesso por pessoas que fazem arte. Tiê se mostra inteira, com todas as dúvidas, arrependimentos, dores e delícias que formam todos nós, um ponto em comum com todos que eu admiro, de Leonard Cohen a Johnny Cash, de Bruce Springsteen a Tom Waits.
(Um detalhe que me fez gostar mais ainda da moça: numa entrevista dela que vi no YouTube, ela cita Tom Waits e do quanto gosta de lavar louças ouvindo Closing Time. É o meu disco favorito do momento, descoberto recentemente, e realmente é a melhor trilha sonora para esse tipo de trabalho doméstico, absorto em si mesmo e nos pratos sujos).

Tiê não revolucionou nada e penso que nem tem essa pretensão. Seu disco de estréia é lindo, verdadeiro em sua simplicidade. Vale com certeza muitas ouvidas, esse é daqueles discos que te fazem companhia, com cada palavra e nota colocadas no lugar certo e que acham espaço e sentido em nossas próprias histórias. Foda-se se vai ganhar alguma coisa da APCA – ainda existe isso? – ou se ela vai virar a “next big thing”. Espero que não. Torço para ela continuar procurando a sua voz e a sua verdade. E que continue sentindo essa necessidade de compartilhar com o resto de nós esses fragmentos de sua vida.

Uma das minhas favoritas do disco: Assinado Eu.

2 comentários:

Staś disse...

I would love to understand smth. Unfortunatly my portugese is not enough good :)

DaniCat disse...

Tb torço muito pra ela continuar mostrando mais suas confissões e verdades na nossa língua, que ela consiga falar do amor com essa "fácl" sinceridade. Eu amo! bjinhos Escoooobs!