domingo, 18 de maio de 2008

O fetiche da mercadoria

Estava esses dias em um bar com amigos, bebendo e falando bobagens quando a conheci. Fitei os olhos da amiga que estava com ela - que estava totalmente maluca de alguma coisa que até agora não consegui identificar - ela veio em minha direção e me abraçou como se eu fosse um querido amigo que ela não encontrava havia muitos anos. A amiga era uma mestiça vulgar, convencida e chegada em álcool. A diversão ideal para uma noite de terça-feira. Ela não era nada disso.

As duas sentaram-se em nossa mesa e fizemos todo o percurso óbvio e conhecido: "como vocês chamam?", "vocês tomam vodka?", "garçom!". Ela se sentou ao meu lado e começamos a conversar. Era bonita, discreta, visivelmente constrangida por estar sentada numa mesa com aqueles desconhecidos mas aceitou a bebida e bebia com parcimônia.

Logo entramos nos assuntos em comum, ela estudava na mesma faculdade que eu havia me formado alguns anos antes, conhecíamos algumas pessoas em comum e eu não conseguia tirar os olhos dela. O assunto fluia, risadas sinceras deram lugar ao joguinho de "quero te comer" que estávamos praticando. O lugar era uma mistura de restaurante de comida japonesa, sinuca, churracaria e karaokê. Com algumas vodkas na cabeça, convidei-a para dançar. Algum cliente bêbado estava berrando algum hit romântico de quinta nos auto-falantes mas, para mim naquele momento, com ela em meus braços, era como se o Marvin Gaye estivesse sussurrando em nossos ouvidos.

Seu perfume era delicado e marcante, sua cintura bem marcada e sua mão deslizava pelo meu pescoço e me fazia desejar que aquela música horrorosa nunca acabasse. Beijei-a. A porra da música acabou. Voltamos à mesa de mãos dadas.

Mais alguns minutos de papos e carinhos, disse que precisava ir embora. Sorri, imaginando o quanto eu gostaria de colocá-la em minha vida à partir daquele momento e o quanto queria sair dali com ela, levando-a pela madrugada para onde ela quisesse me levar.

"Lindo, preciso ir agora".
"Jura? Para onde você vai agora? Podíamos ir juntos."
"Não vai dar. Vou trabalhar agora"

A ficha caiu na hora, mas fiz a pergunta mesmo assim:
- O que você faz?
- Eu faço programa.

Não sejamos hipócritas. Aquilo fez diferença para mim. A ladainha do "vou tirar você desse lugar" realmente não me atraía em nada e não tinha interesse nenhum em tirar vantagem dessa breve união que tivemos para obter serviços grátis. Seria como chamar o Tevez para bater uma bola depois de um dia de treino: você não faz as coisas que as pessoas fazem de graça com um profissional que faz isso todo dia e espera que ela se divirta com isso.

Trocamos telefones, disse que ligaria e não liguei. Recebi uma mensagem dela no celular dois dias depois. Tinha adorado me conhecer e queria me ver de novo, em situações "decentes". Imagino que ela se referia a uma cerveja, um cinema ou nada que envolvesse fezes ou animais, imagino. Não respondi a mensagem.

Poderia discorrer aqui agora um tratado sobre tabus, preconceitos, desejo e sexo, mas não acho que seja o caso. Não tive interesse em me envolver com uma prostituta, pelo fato único e exclusivo da atividade que ela exercia. Eu sou uma pessoa ruim por isso?

Gosto de pensar que não sou.

Eu sempre vou lembrar do quanto ela me fez feliz naquela noite e do seu perfume. Não é esse tipo de sensação que ela vende aos seus clientes? Uma falsa sensação de intimidade é a chave de sua profissão; mais que sexo, os homens querem possuí-la, sua alma inclusa. Eu vislumbrei uma pequena fração dela. E sabia que não poderia ser minha.

Espero que ela seja feliz.

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